Devo seguir até o enjôo?
27 sexta-feira ago 2021
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25 quarta-feira ago 2021
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in24 terça-feira ago 2021
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inO prédio em que eu morava. Le Saturne, número 365. Apartamento 15.
Era perto da esquina com uma movimentada avenida e tinha um pequeno Carrefour bem em frente, lembro do cheiro de fumaça dos escapamentos de carros e ônibus de passavam rápidos pela avenida. Lembro também do cheiro das baguetes fresquinhas no final da tarde, um cheiro inebriante que se misturava ao barulho de garrafas de vinho retiradas das prateleiras, todos os dias, com muitas pessoas fazendo o mesmo ritual. Lembro das mozzarellas em bolinhas e que pareciam com um mini queijo minas, lembro dos pacotes de picolés que eu levava para casa e meu filho amava.
No meu prédio tinha uma enorme árvore bem no meio do estacionamento. Não sei qual, mas era grande. Meu filho brincava em volta, quando a neve caiu pela primeira vez naquele outubro gelado meu filho colocou gorro e jaqueta, desceu para brincar com a mãe e corria tentando pegar os floquinhos de forma perfeita. Quando vi a neve pela primeira vez nesse dia que amanheceu lindo e de céu azul eu voltava da biblioteca e já estava na minha rua, estiquei a mão enluvada em meio as pessoas que passavam apressadas e já estavam acostumadas. Mas eu não estava.
Bastava descer um quarteirão em direção oposta à da avenida para que os ruídos desaparecessem, como se outro mundo se descortinasse. Havia um parque cheio de árvores e brinquedos, um parque onde meu filho corria e tentava se comunicar com outras crianças que não sabiam a língua dele, embora eles se entendessem por gestos, olhares, confianças mudas e desconfianças ruidosas, como só as crianças fazem e como nós desaprendemos há muito. Ali vi esquilos pela primeira vez na vida, roedores lindos e assustadiços, que viram de costas pra você quando ganham comida.
Naquele jardim e em muitos outros sentei para ver e fazer nada. Para ler. Para chorar de saudade daqui. Para chorar de tristeza por partir.
Para chegar à faculdade eu descia por essa rua, ultrapassava o jardim e olhava os carros estacionados, sempre os mesmos e que eu reconhecia pelos amassados que nunca eram consertados. Numa descida íngreme passava uma pequena rotatória que tinha um cruzeiro. À direita fica a escola maternal onde deixava meu filho que me olhava desamparado no início, ansioso depois. Seguia pela mesma rua em um trecho em que carros não circulam e onde eu parava para tentar a sorte na loteria, ou cortar o cabelo, ou simplesmente passar e ver as pessoas que conversavam em frente às lojas. Naquela rua, em certa época, todo o comércio fechava e um festival de bandas agitava o bairro. As bandas saíam da minha rua e entre barracas de cerveja, refrigerantes, salgados e doces, meu filho corria atrás das bandas mais animadas, feliz com tão pouco.
Nessa rua havia uma boulangerie com uma atendente linda como Maria Fernanda Cândido, de olhos verdes e que causava filas para comprar baguetes e croissants, havia um pizzaiolo argelino, um açougueiro líbio, uma lavanderia com um marroquino estridente e sempre alegre, havia um mundo em poucos metros.
Um dia, passando pelo comércio e já perto da faculdade, no meio da tarde ouvi alguém numa casa logo em frente, tocando piano. Não sei qual música, nem quem tocava, as janelas fechadas e as cortinas cerradas. Só sei que, por um ou dois ou dez minutos, ou por uma vida, fechei os olhos e senti a paz que um dia queria que corresse o mundo, até voltar para mim, pensei num mundo em que seríamos versões melhores de nós mesmos e que pararíamos de vez de piorar. Durou pouco, significou muito. Abri os olhos, agradeci em silêncio e segui para a biblioteca.
Minha rua era um mundo onde as folhas de outono pareciam cair mais lentamente. Um lugar onde a poesia e a vida andavam juntas. Um lugar onde deixei um pedaço de mim e de onde trouxe algo que não posso devolver.
Minha rua era um mundo.
13 sexta-feira ago 2021
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13 sexta-feira ago 2021
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in09 segunda-feira ago 2021
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inO velho pensava sempre no mar como sendo la mar, que é como lhe chamam em espanhol quando verdadeiramente o querem bem. Às vezes aqueles que o amam lhe dão nomes vulgares, mas sempre como se fosse uma mulher. (O velho e o mar, Ernest Hemingway)
Certa vez escrevi e acho que não foi aqui, que somos seres feitos de perdas. Quantos de nós passamos a vida acreditando firmemente que estamos ganhando quando, na verdade, passamos a vida deixando pedaços de nós e de nossos sonhos pelo caminho?
A vida, também já disse, é um caminhar sobre escombros e só nos resta, a cada dia, erguer os olhos ao horizonte e caminhar confiante em direção a um novo dia que chega.
Todos esses pensamentos e muitos outros me vieram à mente quando li O velho e o mar, o livro mais conhecido de Ernest Hemingway. Neste livro pungente, comovente até os ossos, o Nobel de literatura de 1954 compõe uma ampla e bela alegoria da vida, com o velho pescador Santiago e seus 84 dias sem pescar peixe algum, saindo para uma pescaria sozinho com seu modesto barco e seus equipamentos tão simples, a vontade de reencontrar a sorte perdida e seus pensamentos sobre o beisebol e a vida.
Santiago não é obcecado como Ahab, ele não quer uma Moby Dick para se vingar, o velho não é o espírito vingador que rasga os sete mares em busca de uma reparação, o Oceano de Santiago é com letra maiúscula, é maior, é a vida e toda sua contemplação da perda e, ainda assim, da determinação em continuar.
E no mar, que é como o sertão de Riobaldo, é o mundo, Santiago não encontra o diabo no meio do redemunho, ele encontra o grande peixe-espada que ambicionou por tanto tempo. E Hemingway, numa prosa enxuta mas ainda assim carregada de poesia nos conduz pelos olhos e pelas mãos de Santiago na sua luta contra o gigantesco animal que,afinal, não é a cachalote branca feroz e sanguinária mas a representação mais acabada do que, muitas vezes, passamos a vida perseguindo e que um dia, emocionados, encontramos. Navegando pelas páginas, sentimos a dor nas mãos de Santiago que sangram na luta paciente, com ele sentimos sede,fome, o sabor dos peixes que ele eviscera e devora crus para manter-se forte, O Oceano é belo, é cruel é capaz de nos dar o maior dos presentes e tudo nos tirar antes que voltemos à costa.
E depois de finalmente vencer o peixe pelo qual esperou a vida inteira, nos desesperamos com Santiago: ele luta contra tubarões que atacam impiedosamente seu prêmio, maldiz a sorte, mata muitos tubarões e chega exausto à praia. Nada lhe resta,a não ser a própria dignidade e a esperança de que na próxima pescaria terá melhor sorte.
Mas, ora, o que sobra para quem tudo perde depois de tanta luta? A dignidade, eu arriscaria. É pouco. Também é tudo para nós, seres humanos que somos feitos de perdas nos nossos alicerces.Falamos sozinhos, nos lamentamos, choramos de dor e tristeza, rimos e pensamos no beisebol, no futebol, nas oportunidades que aproveitamos ou jogamos pela janela? Bem, isso é a vida e Santiago bem sabia disso, na sua sabedoria tão simples. Ele teve tudo, perdeu pelo caminho e só o que sobrou foi ele mesmo. No final, somos muito Santiago, muito mais que vitórias, nossas perdas nos definem e dizem que somos.
E, se vocês se partirem com Santiago nessa pescaria e verem as algas e peixes fosforescentes e céu salpicado de estrelas, se colocarem a mão na água e sentir o impulso e o sal que fica nos dedos, se lutarem com tubarões para protegerem o que não tem salvação, bem, quem sabe vocês até concluam que a viagem, ao fim e ao cabo, valeu a pena.
A leitura deste belo livro também vale a pena, não deixem de embarcar com o velho em uma última pesca.
Boas leituras!
09 segunda-feira ago 2021
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09 segunda-feira ago 2021
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in07 sábado ago 2021
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